quinta-feira, março 22, 2007

Have I told you lately that I love you?



Falo muito e disparato. Comento o tempo e, pelo caminho, passo em revista a notícia do jornal das oito e a vida da outra. Falo para queimar horas, para encurtar distâncias, para sentir que dou uma parte do que sou. Um vasto leque de futilidades, ao bom sabor de uma risada despreocupada. Porque a vida já é sisuda o suficiente. Algumas vezes, pequenos tesouros. Pensamentos comuns, sensaborões, desabafos que se esperam, pedaços de mim servidos gulosamente com chantilli. Se mudo de ideias, é porque não gosto do tédio. O que eu gosto é de desafinar, de tocar ao contrário. Sou coerente com a minha desarmonia e deixo-me ir, volátil, nessa ilusão de eternidade que partilho.
Só tu és, na promiscuidade das palavras entrelaçadas, o meu último recanto de intimidade. Guardo-te para mim, como um segredo. Não te digo e, a olho nu, parece que nem te sinto. É tamanho o turbilhão do palavrear que me escorre dos lábios, que parece que és uma gota, uma tão pequena gota, negligenciada pelas outras na minha gula de cuspir o mundo. Perdoa-me se te omito, se nem te sei ao certo o sabor. Nunca te disse em palavras. Porque há sentimentos perante os quais elas pouco podem e envergonham-se e nem sequer chegam a acontecer. (não há braços que enlacem o universo inteiro em ti) E a tua presença? É etérea, como um pestanejar, como um manto de estrelas arrepiando-me a pele ao amanhecer. Fecho os olhos e provo-te a doçura, sei-a de côr. Mas não lhe encontrei o nome. Por isso, deixo somente que sejas em mim. Porque tu és sangue, correndo-me nas veias, misturada com o que sou. Desde o primeiro segundo, de tal forma indelével e indistinto que, sem ele, de pouco me valia o nome, um rosto e uma história. Porque este amor que sinto é a minha identidade, o fluxo de vida que agita cada célula do meu corpo. É a primeira imagem (e ainda vejo o teu sorriso), a primeira vez que saboreei o mundo e o vi, pelos teus olhos. Não houve, até hoje, imagem mais bonita. Não há, não houve, não haverá. Ninguém como tu.
Desculpa. Não sei a que cheiras. Há canela e lavanda, o perfume dos limões na árvore, o toque da relva nos pés. Nem sei dos teus olhos se são verdes ou castanhos. Que tempo faz hoje em ti? Se chove, cheiras a terra molhada. E, no fundo do teu sorriso, há sempre aquele travo a mel. Como se eu nunca te pudesse desiludir. Acreditas no poder do Amor (depois do mundo te desiludir, como consegues?) e em mim mais do que em ti mesma. Constróis-me assim, como gostarias de ter sido desde o início. Empenhas toda a tua paciência, compreensão e carinho a ensinar-me a ser forte e dócil, para que os embates do mundo não possam derrubar o meu sono. O que não sabes é que essa sabedoria que pensas ler nas nuvens sempre esteve dentro de ti. Ouvi, encostada ao teu peito, uma concha segredar-me as pérolas que cala o fundo do teu mar. Ouvi dos teus medos, das tuas quedas, das tuas lágrimas. Perguntei-me como consegues, depois de tudo, manter o olhar cristalino. És mais do que sabes, mais vida, mais água, mais luz. Tu és rocha dura, saindo incólume do desgaste das ondas e, em ti, tenho o meu abrigo secreto, o meu rasgo azul de céu. Eu, por ti, sou animal, possuída pela mais instintiva forma de amor. Não sei amar-te diferente. Só com tudo o que sou, procurando-te nas luzes e nos silêncios, a ti e ao teu odor cálido a vida e a sonhos.

(Deito a cabeço no teu regaço e é como se o mundo voltasse a ser uma bolsa de água, silenciosa. Como se me escondesses, e eu estivesse só contigo, onde mais ninguém me pode encontrar.)

Voo porque tenho asas. Aquelas que me deste, lembraste? Que suturaste, que cozeste remendos, que beijaste para passar a dor. Mas nenhumas asas me levam para longe de ti. Servem só para te passear até ao limite da nossa imaginação e te trazer de volta, porque qualquer realidade é doce, se tu estás. Ainda te sinto o calor, como um berço embalando-me as contas coloridas que eram as horas nessa altura. Apetece-me ser grande e cobrir-te e apagar o passado, reescrever a tua história. Mas, se o fizesse, não serias tu, pois não? É egoísmo se te quiser assim? Amar-te-ia sempre. Mas foi esse teu passo de menina, a cor de fogo que os teus cabelos roubaram à terra onde rebolavas em criança, a brisa de seda espreitando nas janelas do teu corpo que eu aprendi a amar. Foi uma mulher de contrastes que me deste a conhecer, brava nas colheitas, sensível com os espinhos insuspeitos das rosas, frágil e resistente, determinada e insegura, forte e vulnerável, de uma beleza ingénua e uma delicadeza musical. Aprendi esse mundo rico que palpita no teu peito, o teu jeito de pôr-do-sol na pradaria. Decorei as tonalidades do teu céu e não quero outro. Como poderia querer? Se és inteira em mim, se te invejo de uma admiração convulsiva. Desejo todos os dias ser digna de ti, ter alma e coração bastantes. Queria só que soubesses, dito assim, toscamente. Não o sei dizer de outra maneira.

(nunca haverá palavras que te possam olhar o brilho nos olhos)

E, ainda assim, toda eu sei, porque acendes o meu mundo, que a vida começa e acaba em ti. Queria que soubesses.


Have I told you lately that I love you?
Have I told you there’s no one else above you?

7 comentários:

Anónimo disse...

Filhinha,

É a mais bonita declaração de Amor alguma vez escrita. A emoção que sinto é tão grande que me impede de ter clareza suficiente para te agradecer...
Não precisas de "dizer em palavras", o teu olhar fala por ti.
Todos os dias eu sei que vale a pena viver, mais e sobretudo, porque existes, para mim. És o Anjo abençoado que Deus me enviou. És a minha Luz, és o meu AMOR.

Tó-Zé disse...

mto bonita a tua forma de amar...e o texto ta mto bom

adoreii

*

rtp disse...

Gostei muito de ler. Aliás, não tenho muitas palavras para comentar este post! Penso que quase todas sobram. Direi apenas que é muito belo!

Anónimo disse...

Tanta suavidade. Vais pelo caminho ainda ou já lá chegaste?!

:)

Cristiano Contreiras disse...

ÓTIMO, ótimo esta blogsfera e conceitual.

abração

Sandra disse...

Minha linda este texto tem sem dúvida o dom de deixar as pessoas sem palavras de tão belo que está...
Tu és realmente uma pessoa especial, iluminada.E eu fico contente por te ter por perto!
Bjinho grande=)

alguem disse...

Adorei o texto...
Por vezes esquecemo-nos de dizer o quanto alguém nos é importante, e por vezes também sentimos necessidade de ouvi-lo...
Beijo ** :)