quinta-feira, junho 29, 2006

Liberdade

Ai que prazer
não cumprir um dever.
Ter um livro para ler
e não o fazer!

Ler é maçada,
estudar é nada.
O sol doira sem literatura.
O rio corre bem ou mal,
sem edição original.
E a brisa, essa, de tão naturalmente matinal
como tem tempo, não tem pressa...

Livros são papéis pintados com tinta.
Estudar é uma coisa em que está indistinta
A distinção entre nada e coisa nenhuma.

Quanto melhor é quando há bruma.
Esperar por D. Sebastião,
Quer venha ou não!

Grande é a poesia, a bondade e as danças...
Mas o melhor do mundo são as crianças,
Flores, música, o luar, e o sol que peca
Só quando, em vez de criar, seca.

E mais do que isto
É Jesus Cristo,
Que não sabia nada de finanças,
Nem consta que tivesse biblioteca...

Fernando Pessoa

Este poema faz parte da minha infância... Tanto que praguejei e espernei... Às vezes, acho mesmo que só o declamavas para me ver irritada... E depois resolvermos a nossa pequena desavença com uma doce luta de almofadas (pobre de quem não tem memórias assim). Demorei tanto tempo para o perceber... Mas agora sempre que o leio oiço a tua voz, grave, ritmada, cheia de vida. Como poderíamos saber que seria este o caminho? Que um dia eu saberia de finanças e só então perceberia a inutilidade de tanto conhecimento, que me entedia, que me preenche, que em mim se transforma em mil outras coisas. Tinhas razão, o que importa é o sol e a lua e as flores e essas crianças que correm à minha volta e me deixam louca... Que têm a minha afeição mais pura. É tão intenso o sabor da liberdade quando é conquistada... Tão terno recordar as nossas tardes... Só queria saber dizer-te como tenho saudades tuas...

domingo, junho 25, 2006

Obrigada por serem luz...

Fotografia de Gonçalo Almeida

Às vezes, a vida dói. São tantos os momentos em que o medo faz descer a sombra entristecida da noite sobre nós... Às vezes, o olhar trai a subtil nostalgia de poder pouco mais do que nada para agarrar a réstia de esperança que nos escorrega por entre os dedos. É nessas alturas que percebemos que temos que entregar o nosso destino e confiar... e acreditar que cada obstáculo no nosso caminho nos aproxima um bocadinho mais do céu.

Para mim, o céu é todo o carinho dos que ficam, dos que não têm medo de olhar a minha dor nos olhos, dos que não se escondem atrás de frases feitas ou de optimismos de plástico, daqueles que me abraçaram e até dos que não disseram nada mas me fizeram sentir que eram âncoras que me prendiam à terra... Porque de vocês eu orgulho-me e por vocês vale sempre a pena lutar.

Faz-me sorrir, por mais triste que o meu sorriso seja, ver as estrelas que não deixam a escuridão roubar-me lágrimas à luz. É de coragem, de muita coragem, abdicar das próprias dores para ser um lugar seguro para o coração assustado de alguém. Se houve quem tivesse fingido não perceber a presença incómoda da tristeza ou quem fugisse, porque desta vez era eu que precisava que me insuflassem vida, também houve quem ficasse, quem não deixasse que me sentisse perdida, quem me mostrasse que a força está em mim e em todos os braços que deixaram a sua própria vida de lado para me virem erguer.

Não posso deixar de agradecer ao mundo, à vida, a Deus ou ao destino... Que eu fiz, que escolhi, que o universo quis para mim... Seja qual for a estrela que reja os meus passos, não posso deixar de agradecer por viver no seio de tanto amor e de tanta coragem. Que estes gestos sejam para mim um exemplo e que nunca eu deixe que os meus próprios problemas me fechem os olhos e me impeçam de estar livre para ser ponte para um lugar melhor.

Obrigada por haver tanta beleza à minha volta, tantos olhos carregados de genuína emoção, tantos pensamentos vestidos de uma preocupação autêntica. Obrigada por ter em casa o melhor exemplo de amor no seu estado mais puro e verdadeiro. Obrigada por haver quem pense em mim ao acordar, por haver quem fique ao meu lado quando o peso do caminho se torna maior do que eu, quem me estenda a mão quando a solidão espreita na esquina dos meus medos.

Obrigada por serem luz para mim...



sexta-feira, junho 23, 2006

A irmandade das dartas

I remember when, I remember, I remember when
I lost my mind
There was something so pleasant about that place
Even your emotions had an echo
In so much space

Maybe I'm crazy
Maybe you're crazy
Maybe we're crazy
Probably

And I hope that you are having the time of your life...

Crazy - Gnarls Barkley

Quando a manhã não é suficiente para iluminar o meu sorriso, vocês roubam raios ao sol e preenchem todo o meu vazio com a vossa presença radiante. Quando as sombras arrastam os sentimentos aos tropeções, vocês dão-me asas e levam-me para um lugar seguro. Não se escondem da tristeza, não fingem que ela não nos incomoda; acolhem-na no nosso seio e acarinham-na, até que deixe de chover, e então espantam-na com uma mão cheia de gargalhadas. Sim, as vossas gargalhadas... São pérolas de orvalho que refrescam os meus dias, que têm o poder divino de curar. Em vocês, eu saro, eu cresço, eu sou melhor...
Porque nós somos mais do que quatro pessoas unidas pela amizade; nós somos uma verdadeira irmandade. No meu egoísta individualismo, nunca pensei que pudesse estar com alguém todos os dias e ter sempre tanto para dizer e ter sempre tantas saudades e vontade de estar perto... Mas convosco é possível, ao vosso lado todo o tempo escasseia, porque no mundo há um espaço que é só nosso e as nuvens e o sol e as pessoas... Nada o pode perturbar.
O que há de deslumbrante nos nossos momentos é que cada uma de nós, tão diferente da outra, é aquilo que intrinsecamente é, sem medo ou qualquer constangimento. É esse o segredo que trespassa o nosso mundo e que nunca ninguém soube entender, mas que nos une com um laço tão forte que vai para além do tempo e da distância. Nunca há um dedo a apontar, uma atitude a julgar ou aquele risinho que ironiza aquilo que se pensa ser rídiculo; há sempre dois braços abertos, para o bem e para o mal, e um sorriso a transbordar de todos os sentimentos verdadeiros que um ser humano pode albergar.
Vocês são lindas, tão lindas que cada dia vale a pena acordar com um sorriso por saber que vos tenho na minha vida. E pode o mundo desabar, pode o riso rebentar... Vocês estão aí. E juntas vamos dançar a alegria de estarmos vivas, juntas vamos chorar porque o mundo acaba sempre por nos magoar, mas estamos juntas... Profundamente juntas...
Obrigada por tornarem a minha vida tão mais feliz...
* Darta Kitty *

sábado, junho 17, 2006

quarta-feira, junho 14, 2006

Tudo o que te quero dizer...


Não me interessa o que fazes na vida. Quero saber o que anseias e se tens coragem de sonhar com a realização desse anseio.
Não me interessa que idade tens. Quero saber se tens coragem de fazer figuras tolas em busca do amor, dos teus sonhos, da aventura de estar vivo.
Não me interessa quais os planetas que regem a tua lua. Quero saber se tocaste o âmago da tua própria dor, se tens estado aberto às traições da vida ou se te fechaste com medo de sofrer novamente. Quero saber se consegues sentar-te na presença da dor, tua ou minha, sem tentares escondê-la, esmorecê-la ou remendá-la.
Quero saber se consegues estar na presença da alegria, tua ou minha, se consegues dançar loucamente e deixar o êxtase inundar-te, da ponta dos pés à cabeça, sem dizer «tem cuidado, sê realista, lembra-te das limitações do ser humano».
Não me interessa se a história que me contas é verdadeira. Quero saber se és capaz de desiludir uma pessoa para seres verdadeiro para contigo próprio; se consegues suportar a acusação de traição e não traíres a tua alma, se consegues despojar-te de fé e ser de confiança.
Quero saber se consegues ver a beleza, mesmo quando não é bonita, todos os dias, e se consegues alimentar a tua vida com a sua presença.
Quero saber se consegues viver com o fracasso, teu e meu, e ainda assim abeirar-te do lago e gritar à Lua Cheia de prata: «Sim!»
Não me interessa saber onde vives ou quanto dinheiro tens. Quero saber se consegues levantar-te, depois de uma noite de dor e desespero, cansado e dorido até ao âmago, e fazer o que for preciso para alimentar os teus filhos.
Não me interessa quem conheces ou como aqui chegaste. Quero saber se enfrentarás as chamas comigo, sem dares um passo atrás.
Não me interessa onde, o quê ou com quem estudaste. Quero saber o que te sustenta, por dentro, quando tudo o resto desmorona.
Quero saber se consegues estar a sós contigo mesmo e se verdadeiramente aprecias a tua companhia nos momentos vazios.

__ Sonhador da Montanha Oriah, Ancião Índio

sexta-feira, junho 09, 2006

No fim, está tudo bem...

Se ainda não está tudo bem...



É porque ainda não chegou o fim.

segunda-feira, junho 05, 2006

Still [nine]teen

E de repente eis que chega a inevitável passagem para o mundo dos adultos. Não, não é uma perspectiva dramática. Acaba-se o teen a finalizar os nossos actos, a desculpar os nossos erros, a preencher a nossa imaturidade. De um momento para o outro apercebemo-nos das expectativas com que a sociedade nos constrange e que não nos quer ver frustrar. Esvanece-se em nuvens fugidias de passado o tempo das birras e do conhecimento imprudente do mundo. E para mim... O que será que me espera agora? Serão estes os «loucos anos 20»? Será o desejado encontro comigo mesma, com aquilo que sou e que passei anos na arriscada demanda de descobrir?
Se chegou ao fim a idade dos porquês, porque é que ainda pontuo a minha vida com interrogações? E se eu não quiser crescer, se quiser continuar à procura da terra no nunca? As dúvidas multiplicam-se nas encruzilhadas, como se nada tivesse sido feito para ser compreendido. Ou serei eu, eternamente dividida entre o que sinto e o quero, o que acredito e o que espero, o que amo e o que odeio e tudo o que flutua nesse entremeio e não sei definir? Serei eu, almejando um impossível infinitamente próximo, desacreditando as certezas que vou construindo apenas pelo prazer de recomeçar a procurar? Talvez eu só não queira chegar... E o que é que isso tem de tão errado?
Para trás fica a mágica consciencialização do mundo, como que abrindo os olhos lentamente enquanto nos apercebemos do universo que nos rodeia, tocando os limites da vida, os extremos da felicidade e do desespero e, por fim, concluindo que na nossa existência humana há tanto de divino como de animal. Dói mudar de pele, ficar a ver os atropelos do dia-a-dia dilacerarem-nos a inocência, abandonar a redoma da infância para nos lançarmos num mundo que não nos pode prometer nenhuma segurança... Demora e dói estarmos em nós. E, por outro lado, é tão doce fundirmo-nos numa existência comum mas que para nós, a cada passo, tem o sabor deliciosamente atraente da novidade...
Só que agora as minhas tempestades serão sobre um chão firme. Agora quererei o curso, um carro, um emprego, uma relação... E se eu não...? Agora apetece-me virar tudo isso ao contrário e continuar à procura de mim! Apetece-me mudar, viajar, fugir.... Agora apetece-me correr e tropeçar e aprender novamente a cair. O meu caminho não está feito, não há passos para eu seguir e eu quero que ele seja à minha maneira. Por isso, deixem-me ser eu. E não me exijam nada, nem respostas, nem futuro, nem o horizonte que eu ainda não quero alcançar. Só se houver mais e mais e mais... Eu quero um pouco mais de adolescência, a inconsciência de não saber, o pecado irascível de querer, um caminho vasto para percorrer. Eu só quero ser eu, intrinsecamente eu e mais nada.