segunda-feira, julho 30, 2007

Fotografar o mundo em mim



Escrevo, porque vivo
É álgebra elementar
Se não escrevesse,
Ainda haveria a minha respiração a embaciar o vidro
E sangue a dar-me corda ao coração
Era ver-me as mãos, descuidadas,
Cravarem-se na saia a cada solavanco de emoção
Tanto faz o sol como a noite mais escura,
E nem que chova ácido e as estações descarrilem,
A paisagem corre nos seus trilhos

[Sem romantismos,
Fantasias ou patéticas poesias]

À hora marcada, trepida e apita nos apeadeiros
E, no frémito das chegadas e partidas,
Embrutece-me o cinzel.

Mas se eu não escrevesse
Tu morrias comigo.

sábado, julho 21, 2007

Apatia


Estava encostada a um canto, os traços da sua beleza vulgar fechados sobre o livro que assentava indulgentemente no joelho, praticando a desapaixonada arte de ser invisível. Sentei-me ao lado, ensaiando um sorriso. Não levantou os olhos [lia Pessoa], não tanto pela concentração como por uma vaga indiferença. Era dona de uma atenção fragmentada, de uns dedos desassossegados amarfanhando as páginas. Foi numa dessas passagens impulsivas que lhe vi as unhas descarnadas, manchadas de vermelho pelo que restou de um verniz barato. Como se tivesse ouvido o meu reparo benevolente, trincou uma delas, dando um inusitado estalido com a língua que me arrancou uma despropositada irritação. Desviei o olhar, o sol tímido desaparecera sob uma neblina diáfana e gélida. Sentindo um arrepio, lembrei-me que deveria ter trazido um casaco. Os comboios chegavam e partiam, as pessoas, na missão inglória de cumprir a sua solene rotina, espelhavam a habitual apatia. Gostava de estações, da confortável sensação de que tudo está no seu lugar e de pensar que quem parte um dia tem que voltar. Dava frequentemente comigo a fantasiar que me levantava e entrava num desses comboios, sabendo que, quando abrisse os olhos no país que me visse chegar, ainda seria eu. Nesses momentos, sentia-me mais vivo, mais lúcido, como se uma lufada de alma soprasse na carcaça seca dos meus átomos.

Olhei para o lado, ela ainda estava lá. Silenciosa e desafiadora, uma gota de água irritantemente suspensa na torneira. Não tinha nada de memorável, era translúcida e fria como uma noite de Primavera. Estava somente distraída do mundo, demasiado anestesiada sequer para lhe contar as horas. Talvez se lhe gritasse aos ouvidos, pensei, e logo a seguir tive a certeza que seria uma perda de tempo. As emoções aborreciam-na e os sentimentos eram um luxo que há muito tinha empenhado junto com o ouro que a avó lhe ia dando pelos anos, prendia-a apenas o infinito tédio de estar viva. Devia conhecer-lhe o zumbido arrastado, porque nem olhou para o relógio. Quando o seu comboio chegou, levantou-se sem barulho e sem triunfo, enfiando o espesso livro na carteira e desapareceu atrás de uma porta ferrugenta.

Não a voltei a ver. Nessa noite, fiz uma mala apressada e os primeiros raios de madrugada, revelando as manchas vivas que os pósteres deixaram na tinta desbotada da parede, encontraram o quarto vazio. No momento em que entrei naquele comboio, era eu a minha paisagem em movimento e o mundo pulsava nos estremeções do arranque debaixo dos meus pés. Foi como se tivesse saltado para a tela, assistia finalmente à minha própria história. E o medo, pensei com espanto, era sangue espraiando-me nas veias uma espécie de humanidade, não a dos ossos e dos tendões, mas a de uma eternidade sorvida no debater dos instantes que nos encaminham para a morte. A minha vida é uma obra de arte.
Não a voltei a ver, nem a ruminar minutos em estações citadinas. Nesse dia lembrei-me do tempo perdido que tinha para resgatar.

quinta-feira, julho 05, 2007

light |up

Ao longo deste ano e meio, tenho vivido através do On my own e crescido com ele. Nas suas origens está um momento exacto, umas costas empedernidas de concentração, um olhar aguçado e o tiquetaquear inquieto dos seus dedos no teclado. Foi um parto simples e o poema nasceu branco e sombrio, fruto natural de uma gestação apaziguada. Foi-me entregue com um abraço amigo e ele, que já navegava pelos meandros encantados da blogosfera, soprou a lufada de ar fresco que haveria de içar as minhas velas

- Faz falta um espaço teu.

Desde então, tenho reescrito a minha história e tantas outras e descoberto a cada dia o sublime prazer de brincar com as palavras. Fascinei-me pela infinita possibilidade que é o mundo dos blogs, com tudo o que tem de solidão e de partilha, um espaço privilegiado de contacto com a realidade. Não posso negar, estou viciada. O On my own ganhou vida própria e uma personalidade que não se verga a todas as minhas vontades... Mas há mais, outros voos e outros destinos, pelo que tenho hoje o prazer de inaugurar o novíssimo






light up

Substancialmente mais leve, o light up não engorda, nem tem contra-indicações. Criei-o para abrigar e divulgar os pequenos prazeres da vida, complementando com um rasgo de sol o lado lunar [e tão acarinhado] que o On my own continuará a ser.


Bem-vindos a um novo conceito de lazer…

Em http://www.lightedup.blogspot.com/